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O SERMÃO

Entrei naquela igreja, um pouco a medo,

Pois era e senti-me um intruso.

Fui recebido com sorrisos e ofereceram-me um lugar.

Por momentos ouve um silêncio.

A música suave parou e um frémito burburinho abafou os passos de um negro bem vestido e de olhar seguro caminhando ausente para o púlpito.

E começou a falar:

- Que o Senhor esteja convosco irmãos.

E o público com devoção ia respondendo:

-          Sim irmão

-          Aleluia

-          Oh, Senhor…

Reparei na sua cara com cicatrizes, as mãos rudes não conseguiam disfarçar uma vida dura que a polidez do fato encobria.

Então o sermão começou:

-          Irmãos, eu era um pecador,

Eu bebia e fumava, eu enganava as mulheres casadas, eu era um homem mau.

E o público abanava a cabeça em reprovação dizendo entre dentes:

-          Hum, hum, que vergonha.

-          Meus Deus, tende piedade.

E continuou o discurso num tom eloquente e sentido.

-          Eu era um jogador. Sim, irmãos, eu jogava e pecava. Abusava da bebida e…

( Silêncio)

As lágrimas corriam-lhe pelas faces e os devotos fungavam já.

-          E… – continuou – eu tirei a vida a um homem.

-          O Senhor tenha dó – diziam entre o público.

-          Eu atravessei o vale da morte irmãos. Mas não temi porque o senhor é meu pastor.

-          Aleluia

-          Amén

-          Sim irmãos, senhor é meu pastor e nada me faltará.

-          Naquela noite, eu fui preso pelas mãos dos homens mas liberto porque o senhor tocou-me com a sua mão.

-          Aleluia (o público começava a entrar em êxtase e a música dava os primeiros acordes).

O órgão tingia já a noite com harmonias premonitórias de um Gospel inflamado.

-          Amén.

-          Sim irmãos, eu fui tocado pela mão do Senhor.

Eu não tenho vergonha de o dizer.

Porque teria?
Aliás, irmãos, eu sinto orgulho.

E agora irmãos,

Eu sou um crente.

Sim, irmãos, eu sou um crente.

E Vós acreditais também num reino que há-de vir, pois eu sei, e Vós sabeis também que ele virá.

-          Aleluia

-          Amén

E a música flamejava já aquelas almas negras de coração e pele cuja fé era tanta que eu chorei.

Chorei porque até agora eu não acreditava e agora eu vi a minha vida desfilar num púlpito e também eu fui tocado pela mão do Senhor.

Aleluia

 

Autor ©: Peter Lee Dolphein 10 Fevereiro 2002

Pintura ©: Peter Lee Dolphein 11 Agosto 2007

http://www.peterleedolph.com

 

Last Modified April 28th 2007 Contact me Terms of Use & Privacy       Go to top